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Efeitos de Uma Segunda Língua na Sua Língua Materna

Todo mundo sabe que saber falar uma língua estrangeira é bom. Na verdade, essa é uma habilidade fundamental nos dias de hoje. Além de ser um diferencial importante na busca de bons empregos no mercado de trabalho, saber uma segunda língua traz mudanças cognitivas importantes para seus falantes. Vários estudos em Psicologia Cognitiva e Linguística têm mostrado isso. No campo da Psicologia, os estudos têm mostrado como falantes de duas ou mais línguas têm facilidades em tarefas cognitivas diversas. Já no campo da Linguística, as pesquisas tendem a enfatizar nos efeitos da língua materna no processo de aquisição da segunda língua.

Uma pergunta interessante, no entanto, é: será que falar uma língua estrangeira afeta nossa habilidade linguística na língua materna? Em outras palavras: será que falar inglês, por exemplo, afeta nossa habilidade com a língua portuguesa?

Um grupo de pesquisadores da Ghent University (Eva Van Assche, Wouter Duyck, Robert Hartsuiker e Kevin Diependaele), em um estudo bem simples, investigou essa possibilidade. O artigo será publicado no periódico Psychological Science ainda este ano.

Em alguns estudos anteriores, pesquisadores observaram que falantes bilíngues são mais rápidos no reconhecimento de palavras cognatas. Palavras cognatas são aquelas palavras que apresentam uma semelhança formal significativa em duas ou mais línguas. Por exemplo, as palavras feminism (inglês) e feminismo (português) são cognatas.  A ideia é que a apresentação de uma palavra em uma dada língua ativa a representação de todas as outras línguas conhecidas.

No entanto, o reconhecimento de palavras é uma tarefa que, apesar da sua grande validade interna, tem pouca correspondência com as tarefas cognitivas com as quais bilíngues estão expostos no dia a dia. No presente estudo, os pesquisadores analisaram o mesmo efeito de facilitação de palavras cognatas, porém em uma tarefa muito mais “automática” e pervasiva: LEITURA.

Os quarenta e cinco estudantes bilíngues (Inglês-Dinamarquês) que participaram do estudo tinham a tarefa de ler algumas frases apresentadas em dinamarquês que incluíam uma palavra cognata (grupo experimental) ou uma palavra controle (frase controle). Eram frases do tipo:

Experimental: Ben heeft een oude oven gevonden tussen de rommel op zolder.
Controle: Ben heeft een oude lade gevonden tussen de rommel op zolder.

Os correspondentes em inglês eram:

Experimental: Ben found an old oven among the rubbish in the attic.
Controle: Ben found an old drawer among the rubish in the attic.

Em português:

Experimental: Ben achou um forno velho no meio das tralhas no sotão.
Controle: Ben achou um gaveta velha no meio das tralhas no sotão.

Para medir o tempo de leitura das palavras-alvo (em negrito), os pesquisadores utilizaram técnicas de rastreamento ocular (medidas específicas de fixações e foveamento).
Os resultados são bem interessantes. Eles mostram que as medidas de tempo de leitura para as palavras cognatas, em comparação às outras, foi estatisticamente menor. Esses resultados são interessantes, uma vez que mostram que, mesmo em tarefas altmente entreincheiradas e em que o conhecimento da segunda língua não é necessariamente relevante, os falantes parecem ativar representações da língua não-dominante.

Outros estudos, obviamente, precisam ser feitos para consolidar os achados dessa pesquisa. Mas, certamente, os resultados apresentados nesse estudo já são suficientemente interessantes para suscitar outros questionamentos.

Van Assche E, Duyck W, Hartsuiker RJ, & Diependaele K (2009). Does Bilingualism Change Native-Language Reading? Cognate Effects in a Sentence Context. Psychological science : a journal of the American Psychological Society / APS PMID: 19549082

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