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Brasil bilíngue: sonho distante

The book is on the table. O chichê nunca fez tanto sentido para ilustrar a relação do brasileiro com o inglês. Literalmente, o livro está sobre a mesa, pois aprender o idioma nunca foi tão fácil quanto agora. Seja por meio dos cursos presenciais com preços mais acessíveis, seja pelas tecnologias de ensino a distância que facilitam a prática. A grande questão é que jamais houve tantas possibilidades diferentes para aqueles que querem conquistar a fluência na segunda língua. Dito isso, a pergunta que fica é: por que mesmo assim a imensa maioria dos brasileiros ainda não fala inglês?

Já é sabido que dominar o idioma aumenta significativamente as chances de obter salário maior, como apontou recente pesquisa conduzida pelo grupo Catho. Segundo o estudo, um profissional em nível de coordenação, por exemplo, pode ganhar, em média, 61% mais do que aquele que não fala inglês. Isso, sem falar nos benefícios econômicos que o país com um todo pode ter, alavancando o turismo e a internacionalização dos negócios. Ainda assim, levantamentos ainda mostram que apenas 3% da população brasileira pode ser considerada fluente em inglês, número extremamente baixo, principalmente quando comparado ao de outros países latino-americanos, como o Chile e a Argentina.

A empresa de educação internacional, Education First (EF), divulga anualmente um ranking que avalia o nível de proficiência em inglês de diferentes países. No levantamento de 2015, o Brasil ocupava a 41ª colocação entre 70 nações. Na mesma lista, Argentina, República Dominicana, Peru, Chile, Equador e México estavam à frente. E os motivos para essa defasagem, a meu ver, são sobretudo culturais.

Um importante ponto que precisa ser desmistificado para aumentar a relevância do inglês é o argumento de que, antes de nos preocuparmos em ensinar um segundo idioma, precisamos concentrar nossos esforços na língua materna do brasileiro. Na verdade, é inegável que o aprendizado da Língua Portuguesa é fundamental e ainda há muito trabalho a ser feito nesse sentido. Mas, diferentemente do que muitos pensam, os ensinos dos dois idiomas não são excludentes entre si, muito pelo contrário. Pesquisas de linguística e neurociência já comprovaram que, quanto mais idiomas uma pessoa domina, maior a facilidade para aprender os demais. Isso se dá, principalmente, pela possibilidade de estabelecer reações entre o que já foi aprendido e o novo conhecimento.

Outro ponto polêmico que precisa ser debatido é o papel de recursos como músicas, filmes e séries na aprendizagem do idioma. Na verdade, assim como uma criança não aprende todos os aspectos do português apenas ouvindo seus pais conversando, o aprendizado do inglês também não ocorre apenas por meio do acompanhamentos dos diálogos na TV ou pela tradução de letras de músicas. É verdade que a prática é muito válida como reforço da aprendizagem. Porém, é fundamental que haja esforço e sistematização para a compreensão conjunta das quatro habilidades básicas da língua: o speaking(fala), o listening (compreensão auditiva), o reading (leitura) e o writing(escrita), respeitando, inclusive, as regras gramaticais e discursivas que coordenam sua composição.

Em muitos casos, a comunicação dos “autodidatas” pode até ocorrer, mas geralmente dentro de um quadro limitado – quando a pessoa pode entender e falar, mas pode não escrever ou ler corretamente, por exemplo. A proficiência, nesses casos, fica bastante comprometida. Por fim, é fato que inúmeros outros obstáculos também precisam ser superados para que o brasileiro comece a priorizar e a estudar o inglês como se deve. Até mesmo o acesso a ferramentas de educação que ofereçam oportunidades reais para a prática do idioma é escasso, o que pode aumentar o desinteresse ou prejudicar o aprendizado da língua.

A tecnologia em suas várias formas, felizmente, vem ajudando os educadores e aprendizes a superar essas barreiras e já vemos soluções ótimas para estimular a compreensão e a conversação. Em geral, a mensagem mais clara que fica é de que precisamos promover logo uma verdadeira mudança no pensamento e na forma como as pessoas encaram o tema, pois só assim colocaremos em curso a mudança que fará do Brasil um país verdadeiramente fluente em inglês. The book is on the table, e precisamos que ele seja lido.

Marcelo Barros – Professor e conselheiro da Braz – TESOL, maior associação de professores de inglês.

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